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Noam Chomsky é, sem dúvida, um dos
intelectuais mais influentes e prolíficos dos últimos 100 anos. Figura
central em diversas áreas do conhecimento que, não bastasse todo seu
trabalho, tem um dom raro: o de conseguir ser extremamente didático,
lúcido e sensato para diferentes tipos de público sem ser simplista.
E este dom fica evidente neste espetacular documentário “Requiem For The American Dream”,
de 2016, disponível no Netflix. Em meros 70 minutos, Chomsky dá uma
verdadeira aula sobre a economia, política e a sociedade do nosso tempo,
baseado em 10 princípios da concentração de riqueza e poder, algo
profundamente interligado e que explica todas as crises passadas, como
pavimentamos o caminho para chegarmos até aqui e as crises e
possibilidades que virão. Afinal, as crises não são somente parte
intrínseca do capitalismo, como também representam o sinal mais
inequívoco de que o sistema está sadio e funcionando, como disse Marx e
Berman.
Através de uma série de entrevistas, realizadas durante 4 anos, Chosmky explica cada um destes princípios:
1. Reduzir a democracia: como
uma das maiores preocupações dos “pais fundadores” da sociedade
americana, expresso na Constituição e na criação do Senado, a exemplo de
James Madinson, era proteger os ricos do “excesso” de democracia,
criando mecanismos para que ela “não fugisse do controle”.
2. Moldar a ideologia: o documento “A Crise da Democracia” da Comissão Trilateral, citado por Chomsky, é exemplar nisso.
3. Redesenhar a economia:
como o aumento exponencial da participação das instituições financeiras
na economia, em detrimento da produção, somada com a desregulação do
mercado a partir dos anos 70, potencializada nas décadas posteriores e a
elevação do conceito de “insegurança do trabalhador” – celebrado por
Alan Greenspan – servem de base para a situação atual.
4. Dividir o fardo: de
que maneira o estado de bem estar social dos anos 50 e 60 e a melhora
das condições de vida da população foi corroído ao longo do tempo,
significando menos impostos para os ricos, que habilmente conseguiram
fazer com que a maioria do povo arcasse com os custos básicos da
sociedade, enquanto a desigualdade atinge picos históricos hoje em dia.
5. Atacar a noção de solidariedade:
obedecendo a máxima de “tudo para mim, nada para os outros” de Adam
Smith, como a educação pública e a previdência social foram atacadas e
diminuídas, ainda que largamente usada pelas classes A e B no passado e
base de sustentação do desenvolvimento da sociedade americana. Partindo
desses exemplos, Chomsky mostra como o capitalismo atua para minar nossa
capacidade de sentir empatia e solidariedade com o outro, conquistando
nossas mentes e nos fazendo refém do egoísmo mais tóxico e abjeto
possível.
6. Deixar reguladores atuarem em causa própria:
o crescimento absurdo do lobby e como as pessoas escolhidas para
definir a legislação são as mesmas que usufruem dela em praticamente
todas as áreas da economia e da sociedade.
7. Financiar as eleições:
grandes corporações financiando as campanhas presidenciais caríssimas
que geram governantes que ficam na mão delas, em um círculo vicioso
absurdo. Soa familiar, não?
8. Manter o povo na linha:
o ataque ao sindicalismo e todas as organizações de trabalhadores. De
que forma eles eram parte essencial da resistência à exploração e ao
abuso e, com o tempo, foram minados, seja diretamente pelo governo, seja
pelas próprias organizações, que trataram de demonizar profundamente a
atuação sindical, chegando a somente 7% de trabalhadores privados
sindicalizados hoje.
9. Criar e propagar o consumismo:
de que forma a propaganda, de maneira bem engenhosa e eficaz, tratou de
criar gerações de consumidores com pouco ou nenhum senso crítico, um
roteiro que todos conhecemos bem.
10. Marginalizar a população:
“marginalizar” no sentido de excluir o povo das discussões principais,
da participação democrática, minando o controle social e gerando
cidadãos apolíticos que se engalfinham num ódio à política e ao governo
absolutamente cego que, claro, compromete os maiores interessados na
melhoria da sociedade: o próprio povo.
Nada disso é novidade, mas a capacidade
de Chosmky em mostrar de maneira concisa e didática o seu impacto,
somado ao arquivo histórico dos realizadores, faz com que esse
documentário seja um excelente resumo de tudo aquilo que é central para o
mundo em que vivemos.
LInk: https://m.youtube.com/watch?v=